Rascunhos do futuro
Texto de Danielle Ichikura.
Todos os dias amanheço às 03 horas da manhã.Religiosamente.
Logo eu, que não sou religiosa, Deus me livre!
Desperto ao lado de animais não humanos que persistem em dominar o meu pensar, ser e estar no mundo. Chamarei ele carinhosamente de: Relatório final.
A vida acadêmica feat universitária segue se movimentando, uma corrida ensandecida ao redor do próprio rabo (ou daquele financiamento), acúmulo de leituras e reuniões online, litros de café a revelia da gastrite adquirida junto com a aprovação no vestibular. Lembrando disso tudo ele aparece, me beija a boca com sabor agridoce e maquiavélico.
Sua chegada foi lenta e gradativa, já era esperado, mas o imprevisível aconteceu, ele chegou e trouxe uma pandemia na bagagem.
Nos afundamos (eu e eu mesma) em rascunhos diversos e fragmentos de anotações, sentimentos, memórias,paixões…
Olho ao redor, procurando espaço e inspiração, não encontro nada, estou vazia.
Encontro outro rascunho, fixado na parede e na minha memória com diversas linhas, desenhos, palavras soltas que se conectam com o mais profundo da minha memória afetiva.
Como produzir sabendo que somos mais de 50 mil mortos no Brasil?
E digo que somos, porquê da vida só sinto saudades.
A responsabilidade sobre a narrativa do outro é algo gigante, nenhuma palavra parece dar conta do transbordar, quem dera fosse possível estruturar um trabalho compatível com os anseios de uma aspirante a pesquisadora. Estamos em um relacionamento abusivo, eu, os rascunhos e o Relatório final, que ainda segue esperando a sua vez de brilhar.
Respiro, por hoje desisto de escrever.
Nos vemos amanhã, 03 horas da manhã, com outro membro da família: O prazo final