Sobre

LaHibrid é o espaço de articulação de pesquisas do Departamento HCV e do processo permanente de reflexão científico-política promovido nesse departamento.

Esse laboratório se propõe a favorecer processos de (re)articulação das naturezas sociais, técnicas e políticas do labor científico na Saúde Pública. Sua dinâmica e sua estrutura física devem ser capazes de acolher, paulatinamente, tal disposição híbrida, coletiva e aberta de pesquisa.

A noção de hibridação aqui usada é apreendida dos Estudos Sociais da Ciência e da Técnica (STS -particularmente de Bruno Latour) e dos Estudos Feministas da Ciência e da Técnica (por exemplo Donna Haraway, Isabelle Stengers, Anna Tsing entre outras). Esses loci científico-políticos têm favorecido a aproximação simétrica entre os mundos/pontos-de-vista das ciências naturais e das ciências sociais. Hibridação é uma noção que opera em oposição à purificação: a ideia e a prática, fundamentais na ciência moderna (e na Modernidade), de traçar divisões ontológicas entre entidades como a Natureza e a Sociedade, a Ciência e a Política, entre outras (Latour). Nesse processo os híbridos –monstros, saberes não classificados, ‘dimensões’ política da ciência ou científica do social, por exemplo- foram tornados impensáveis, marginais à descrição do Moderno. Os processos de hibridação, portanto, dizem respeito à relocalização do campo de conhecimento/ação nas linhas, fluxos e áreas relacionais entre entidades purificadas (e não puras).

Por outro lado, essa noção tem reverberações fortes nos campos da biologia, da química, das artes (gêneros híbridos, por exemplo) e dos estudos de gênero e sexualidades, e ganha relevância quando pensamos na Saúde Pública/Coletiva como um campo híbrido, ou como um campo capaz de favorecer a hibridação de problemas e conhecimentos em saúde. Antes que inter ou transdisciplinar, a hibridação como marca de um campo de conhecimento implica em um processo que reconhece a arbitrariedade histórica das fronteiras (não apenas disciplinares, mas entre domínios: político e científico, natural e social), e favorece o pensamento a partir de processos, conexões e indeterminações. Antes que o espaço de diálogo entre disciplinas do campo científico, nosso intuito é criar e habitar zonas de hibridação e indeterminação entre o mundo marcado com o nome da ciência e seus outros modernos: os mundos da política, os conhecimentos e saberes locais, populares indígenas (etc), os ativismos e militâncias, as artes. Também, nos interessa esse tempo de hibridações futuristas que é o fim do mundo ou, em termos da história da ciência do Boaventura de Souza Santos: esse século XXI que carrega um século XIX que nunca acabou.

O tempo, aliás, é a nossa principal zona de hibridação. Como marca teórica do departamento (saúde, ciclos de vida e sociedade), o tempo nos interessa e nos encontra: os efeitos do tempo nas possibilidades do corpo e da saúde, as diversas e homogeneizantes acelerações contemporâneas, o problema da geração e do curso da vida, os ciclos circadianos e suas reelaborações sócio-políticas, a história das nossas invenções sanitárias e patológicas, os futuros possíveis e inviáveis…

Como efeito do planejamento acadêmico da Universidade de São Paulo, esse departamento vem fazendo uma aposta pela hibridação disciplinar e científico-política. O LaHibrid busca ser o espaço físico de criação, articulação e desenvolvimento de pesquisas e práticas híbridas do nosso departamento. Por tal razão, enquanto laboratório de pesquisa, o LaHibrid propõe uma relação modular e móvel com o espaço, busca favorecer os encontros, a coletivização do trabalho de pesquisa em suas diferentes fases, os processos e tempos da criatividade científica, as práticas de leitura, escrita e comunicação do conhecimento, as alianças com diversas redes, atores, grupos e laboratórios de pesquisa. Buscamos construir um espaço no qual ensino, extensão, experimentação, ludicidade, criatividade, gozo, militâncias e amizade sejam linhas coletivas importantes para a produção de conhecimento. O LaHibrid tem potencial para se desenvolver como um espaço de inovação e como um dispositivo articulador de redes para a produção de conhecimento a partir da Saúde Pública como ciência híbrida.

Objetivos

O LaHibrid deverá favorecer:

Gestão coletiva de projetos de pesquisa, ensino e extensão, incluindo pelo menos um projeto temático a médio prazo no qual os princípios da hibridação sejam desenvolvidos;

Articulação com grupos sociais a partir destes processos contínuos de criação científico-política;

Melhor compreensão das abordagens e construções teórico-político-metodológicas das pesquisas que compõem o Departamento HCV e suas redes, a partir da elaboração de mapeamento de interesses e trajetórias de pesquisa;

Exercícios colaborativos de pesquisa que atrevessem campos e disciplinas.

Formulação de abordagens teórico-metodológicas inovadoras e de maior integração entre campos do saber e entre domínios;

Espaços de divulgação científica, de produção artístico-científica, de estímulo ao trabalho coletivo simetrizante e à imaginação criadora e analítica.

Dinâmica de Uso

Espaço do HCV disponível para grupos e redes de trabalho, espaços de discussão e estudo, leitura, encontros com sujeitos de pesquisa ou com agentes da sociedade civil, organização de materiais de pesquisa, instalação de equipamentos específicos (scanners, computadores para processos gráficos, projetores, etc). Está desenhado para ser um espaço modular que permita dinâmicas de trabalho e estudo individual, pequenos grupos e encontros maiores.

Os cuidados do acesso e da utilização do LaHibrid (chave e agenda) são responsabilidade do Departamento HCV através da secretaria.

Eventos

O LaHibrid se propõe acolher e promover encontros que favoreçam práticas de criatividade, coletivização e hibridação científico-política de processos de pesquisa.

  • Seminário interno de pesquisa do LaHibrid, de periodicidade mensal.
  • Reuniões de trabalho e workshops com professores/as ou pesquisadores/as convidados/as e outros encontros de periodicidade variável como oficinas, reuniões ampliadas de pesquisa e seminários.
  • Feira Baphorau: encontro que propõe apresentar formas artísticas de saber, cuidado e saúde no e do corpo, para além das normas acadêmico-científicas mais tradicionais. Esta feira híbrida busca provocar a produção de conhecimento hegemônica na saúde através da arte e da abertura a saberes diversos em relação. Além disso, é um espaço de fuga, criação e encontro para a forças artísitico-criativas que fervilham na Faculdade de Saúde Pública. É organizado pelo Coletivo de Pesquisa em Antropologia e Saúde (CPaS-1), com o apoio do departamento de Saúde, Ciclos de Vida e Sociedade e da Comissão de Extensão da FSP.  
  • Seminário Permanente Nos Quarteirões da Higiene. Este espaço mensal com convidados externos à Faculdade busca fortalecer as discussões e a vida pública de temas e questões vinculadas às ciências sociais e humanas, às problemáticas de diferenças e desigualdades (raça, gênero, sexualidade, entre outras) e ao trabalho dos movimentos sociais. Seminário aberto ao público. Algumas das sessões de 2018 e 2019 foram transmitidas on-line ou registradas audiovisualmente e, a partir de 2020, estarão disponibilizadas num canal de Youtube que está sendo preparado (ver: https://www.youtube.com/channel/UCp5vXsgOSfffCMBWJjzfbfA).
  • Foram realizadas até agora 9 sessões do seminário com periodicidade mensal, assim:
  • “Gerir versus gerar: vasectomia, aborto e adoção como política da prosperidade na Igreja Universal”, Doutora Jacqueline Moraes Teixeira, FSP/USP, 26/06/2018
  • “A (In) visibilidade lésbicas e demandas para a saúde: olhares em um contexto de mudanças políticas”, Doutoras Paula Gondino (FSP/USP) e Regina Facchini (Pagu, Unicamp), FSP/USP, 29/08/2018
  • “Corpos Trans e a produção de cuidado”, Dra. Silvana Nascimento (FFLCH-USP), Victor Vasconcellos e Lenin Viana (ambos homens trans e professores da rede pública), 11/9/2019.
  • “Redução de danos é autocuidado: saberes que vêm da rua”, Juma Santos (Organização Tulipas do Serrado), 12/11/2019.
  • “Corpo, controle e informação: os aplicativos de ciclo menstrual e gravidez”, Dra. Daniela Manica (LabJor/Unicamp), 13/11/2019.

Projetos em Elaboração

A pandemia de SARS-CoV-2/COVID-19 afetou todas as esferas da vida. Há dúvidas se o novo coronavírus será capaz de induzir imunidade, permanente ou transitória. Dos demais seis coronavírus que nos afetam, três podem reinfectar com quadros clínicos pouco severos. Os casos de SARS não ocorrem desde 2004 e os casos esporádicos de MERS, coronavírus mais letais, não permitiram avaliar se há reinfecção. Adicionalmente, não há tratamento ou vacina no horizonte imediato. Isto cria uma grande incerteza, pois embaraça a imaginação do futuro.

As rotinas de diversos grupos e redes sociais foram alteradas de formas também diversas e, em alguns casos, de formas dramáticas. Para muitos destes grupos isso implicou em mudanças nos hábitos cotidianos, como dormir, comer, trabalhar, estudar, circular pelos seus territórios, aproveitar horas de lazer. Para muitas pessoas o período de quarentena, isolamento, distanciamento físico e restrição das mobilidades implicou importantes desorganizações e rearranjos nas suas casas e espaços de habitação e de trabalho, também na configuração de redes de vicinalidade e de co-habitação, nas suas vidas amorosas e sexuais, nas suas relações familiares. O acesso a ar livre, a sol, a exercícios físicos e a infraestruturas urbanas de encontro e diversão foi restrito ou impossibilitado para diversas pessoas. Estes efeitos da pandemia e da sua vida social e política no Brasil têm uma variação significativa em termos do território (região, estado, cidade, bairro) e do tempo do desenvolvimento da pandemia. Igualmente, os efeitos e as reelaborações da pandemia apresentam importante diversidade se pensados em termos de operadores articulados de diferença e de desigualdades: gênero, sexualidade, geração, relações étnico-raciais, forma de trabalho e posição econômica, local de moradia, composição familiar e de redes de apoio, etc.

De certa forma, pode-se dizer que a pandemia é um novo marco de mudança na sociedade moderna, assim como foi a descoberta da luz elétrica ou como algumas catástrofes. O advento da luz elétrica mudou a vida das pessoas; fábricas durante a Revolução Industrial, que começaram a funcionar à noite, mudaram os hábitos e costumes das sociedades ocidentais. Discussões sociológicas sobre a distância entre sociedades industriais e comunidades rurais que mantiveram sua estrutura e tradições destacaram o impacto de uma invenção na sociedade contemporânea.

No presente projeto, queremos compreender o impacto da pandemia no cotidiano de determinados grupos ou redes sociais no Brasil, levando em consideração um sistema interseccional de diferenças que nos permita construir uma paisagem analítica de diversidades e multiplicidades.